Saúde Mental e a Economia do País
Cada vez mais brasileiros procuram ajuda psicológica por conta da crise econômica
O brasileiro anda vivendo dias difíceis. No trabalho, a pressão por bons resultados é intensa e a ameaça de perda do emprego, constante. Quem foi demitido sofre a angústia de tentar se recolocar profissionalmente e se deparar com portas cada vez mais fechadas. Nos jornais, a avalanche de más notícias econômicas e políticas desenha um cenário asfixiante, de perspectivas pouco animadoras para os próximos meses. Uma pesquisa da Confederação Nacional da Indústria captou em números a sensação da maioria da população: o medo do desemprego cresceu 32% de dezembro a março e o Índice de Satisfação com a Vida caiu 8% em relação a dezembro. É o menor índice da série histórica.
Essa atmosfera tão pesada começa a produzir repercussões na saúde mental dos brasileiros. Nos consultórios médicos, os últimos meses têm sido marcados pelo aumento no número de pessoas em busca de ajuda para lidar com sintomas de ansiedade e de depressão desencadeados pelas incertezas e aflições da crise que vive o País.
A maioria dos indivíduos chega na frente do médico com queixas de insônia, irritabilidade, dificuldade de concentração, apatia, cansaço. Na origem dos sintomas estão o medo de perder o emprego, a ansiedade em saber se será possível encontrar um novo trabalho e a continuidade de notícias ruins sobre o País, sem perspectiva de que isso mude a curto prazo.
A associação entre crises e doenças psiquiátricas é algo indiscutível aos olhos da ciência. A última grande lição sobre como uma coisa leva inexoravelmente à outra veio com o crash financeiro no qual os Estados Unidos e a Europa mergulharam em 2008, com consequências ainda desastrosas para muitos países. Nas nações mais fortemente afetadas, como Grécia e Espanha, boa parte da população sofreu pesadamente de ansiedade e pressão. Um levantamento realizado por pesquisadores espanhóis, por exemplo, demonstrou que entre os anos de 2006 e 2010 houve, na Espanha, 19% de aumento no número de casos de transtornos de humor, 8% no atendimento a crises de ansiedade e de 5% de doenças associadas ao abuso de álcool.
Ansiedade e depressão são enfermidades diferentes mas passíveis de serem desencadeadas em tempos complicados. Isso porque são resultado de uma combinação que inclui desde mecanismos desenvolvidos pelos homens ao longo de sua evolução até falhas na construção da resiliência – a capacidade de cada um de resistir às pressões. No caso da ansiedade, trata-se de um estado necessário à sobrevivência. É ela que ajuda o corpo a se preparar para uma situação adversa, ameaçadora. Por isso, vem marcada fisicamente por respostas que deixam o organismo pronto para reagir: aumentam a pressão arterial e o batimento cardíaco e deixam o cérebro em alerta.
O problema é quando esse estado de prontidão não se desarma. Desta forma, a possibilidade de haver um remanejamento na empresa ou de não conseguir pagar a próxima prestação do carro é capaz de acionar de novo e de novo o esquema, trazendo um sofrimento tão grande e tão freqüente que a pessoa tem dificuldade para viver sua vida normalmente. É o que os médicos chamam de ansiedade disfuncional. Ou seja, ela perdeu sua função principal, a de ajudar o corpo a responder, e passou a ser uma doença.
Na depressão, a reação é outra.
Duas das marcas da enfermidade são a apatia e a extrema dificuldade de enxergar novas perspectivas, a luz no fim do túnel. Circunstâncias difíceis – como as experimentadas atualmente no Brasil – engrossam o caldo propício à manifestação ou ao agravamento de ambas as características.
Um ponto comum no desencadeamento da ansiedade e da depressão é um processo fisiológico que tem por trás o estresse crônico – algo que tende a se acentuar em dias como os atuais. São cada vez mais evidentes as constatações científicas de que submeter a mente ao estresse durante períodos mais extensos promove mudanças no cérebro que deixam as pessoas mais vulneráveis às duas enfermidades. Uma delas é o aumento no surgimento de células produtoras de mielina (bainha que recobre as fibras nervosas) e menor produção de novos neurônios. Isso provoca uma quebra no delicado equilíbrio do sistema de transmissão de informação entre um neurônio e outro, predispondo o cérebro a apresentar falhas em seu funcionamento que podem resultar nas duas enfermidades.
Como não se tratam aqui de questões simples de serem resolvidas, para as quais exista apenas uma saída, o tratamento das duas doenças exige medidas diversas. Do ponto de vista médico, elas incluem o fornecimento de medicação e psicoterapia.
A modalidade de terapia mais indicada é a cognitivo-comportamental. Como diz o nome, ela atua nas esferas cognitiva, dos pensamentos, e de suas manifestações comportamentais. O objetivo é ajudar o paciente a identificar pensamentos que estejam associados ao aparecimento de sintomas, encontrar formas de neutralizá-los ou de transformá-los e mudar os comportamentos que normalmente estão a ele vinculados. Na prática, significa, por exemplo, auxiliar um paciente a dar nova avaliação a uma situação que considera ameaçadora.